sábado, 23 de maio de 2009

resposta

Tenho alguma tendência para ser pouco tolerante com a incompetência injustificada, como a que resulta da preguiça, por exemplo. Mas ao que sou mesmo avesso é à inteligência vendida, reptante, e à manipulação consciente da informação, ainda que através de artigos de opinião.

Confesso que já não trago comigo a edição de hoje do jornal Público onde a páginas tantas São José Almeida escreve umas abjectas linhas sobre um tal Projecto de Lei da JS sobre Educação Sexual porque a repulsa que me provocou foi tanta que foi direito para o primeiro caixote do lixo por onde passei ali mesmo no Saldanha (grande marcha!). Por isso mesmo, não terei capacidade para fazer citações neste pequeno texto de "resposta" porque não encontro versão online da mesma peça de SJA.

Ora, a pretexto de um suposto desafio ao Partido Socialista, com um apelo implícito à "resistência" do PS contra as imposições mais conservadoras dos segmentos religiosos da população e suas instituições, SJA invocava o processo de discussão e votação na especialidade do Projecto de Lei da Educação Sexual.

1. SJA refere-se ao Projecto de Lei como "Projecto de Lei da JS"(Juventude Socialista) o que revela em poucas palavras uma rede de mentiras. Vejamos: o Projecto de Lei inicial é do PCP, depois acompanhado pelo PS, ambos baixaram à especialidade. A determinada altura, SJA refere que é a JS que, "cumprindo a tradição", traz novamente este assunto à Assembleia da República, o que é manifestamente falso. Primeiro porque a JS não tem Grupo Parlamentar e não pode ser autora de projectos. Segundo porque o primeiro Projecto até foi do BE (rejeitado), o segundo do PCP(aprovado) e só meses depois surge o do PS (não sem ter adiado por alguns meses o trabalho parlamentar).

2. SJA omite deliberadamente o papel do PCP na construção das leis da educação sexual do país, desde 1982. Consegue mesmo introduzir uma alusão positiva ao BE lembrando o PJL do casamento entre pessoas do mesmo sexo, mas curiosamente esquecendo o único projecto responsável sobre essa matéria que foi apresentado - o dos Verdes (que contou com o apoio do PCP, mas com a rejeição desse grande partido da esquerda democrática que é o PS).

3. SJA só releva o papel do PCP numa infeliz e rasteira passagem do seu texto para criticar (com toda a legitimidade) uma proposta de alteração que o PCP fez na especialidade, propondo que onde se lia "igualdade de género" se passasse a ler "igualdade entre os sexos" (sobre o meu entendimento sobre essa questão, pode ler-se aqui). Ora, SJA diz que essa alteração constituiu um retrocesso, uma importante cedência ao conservadorismo. Acrescenta mesmo que vai contra todas as directivas europeias (?). Ora, a crítica de SJA à opção do legislador é legítima e só tenho mais que a compreender. O que não é de todo legítimo é que SJA refira no mesmo saco o voto da direita e de dois deputados do PS, atire a bujarda ridícula das "boas práticas europeias" e passe ao lado da justificação que eu próprio lhe dei, por telefone, um dia antes da publicação de tão infeliz texto. É que, aparentemente, SJA não gostou da explicação do PCP sobre a alteração de "género" para "sexo" e então fingiu desconhecê-la e colar assim o PCP à direita e à tal ala política do conservadorismo.

Lamentável é, no entanto, que uma jornalista de tão elevada craveira e de tão consolidado reconhecimento público, justifique as suas opiniões com sufismas e axiomas de tal forma superficiais que roçam a inépcia argumentativa, que mental não julgarei. Ora, é minha firme convicção de que a desfiguração e mistificação dos conceitos através da manipulação do léxico é um dos poderosos instrumentos de dominação ideológica do capitalismo. Tal como os "trabalhadores" se converteram em "colaboradores" e os "operários fabris" em "técnicos de linha", "técnicos de montagem" e outros que tais e eu não considero que essa conversão seja progressista, também não considero que a mistificação do "sexo" com a introdução de um conceito subjectivo seja progressista. Na verdade, o facto de a União Europeia estimular esse uso (do "gender", "género") só reforça a minha aversão à utilização do termo na política.

4. Que SJA queira, como tantos outros e bem, utilizar esse termo para avaliações analíticas, sociológicas, psicológicas, ou outras do género em que tal se aplique, tudo bem. O que não se pode pedir é que a legislação passe a incluiur categorias analíticas como conceitos objectivos. Mais que não seja por uma questão de prática legística, o termo "igualdade de género" é absolutamente desadequado por não significar absolutamente nada.
Aliás, se alguém puder, objectiva e coerentemente, explicar-me exactamente o que significa "igualdade de género", eu agradeceria. É que, no mínimo seria sempre "igualdade entre géneros" para que a coisa fizesse o menor sentido. Mas deve ser do meu cérebro retorcido e conservador, pois concerteza.

1 comentário:

Maria disse...

Belo texto. eu já não tenho paciência para os jornais diários...

Abraço