segunda-feira, 23 de março de 2009

Os professores e a Escola Pública

Muitas vezes somos confrontados com questões sobre o apoio político que o PCP e a JCP atribuem à luta dos professores e estudantes. É natural que assim seja, particularmente no caso dos professores, sendo que se trata de uma classe profissional relativamente distante dos problemas do operariado e que tem vindo ao longo dos anos a encarar-se a si própria, ainda que involuntariamente, como uma elite intelectual.

Os professores têm, de facto, vindo a distanciar-se das preocupações mundandas e quotidianas dos operários, e mesmo de um vasto conjunto de outros profissionais. Na generalidade, se excluirmos os professores mais novos, são profissionais com relativa estabilidade na carreira e sem inclusão em hierarquia concreta e directa, o que lhes permite um grau de autonomia distinto daquele que é permitido aos restantes trabalhadores. Isso não é, todavia, negativo na medida em que essas são condições inerentes à missão docente. Ou pelo menos deveriam ser...

Fruto de uma política de degradação generalizada das condições de vida dos portugueses e de desatenção às necessidades da Escola Pública, acumulada ao longo dos anos e protagonizada por sucessivos governos, a Escola tem-se distanciado também do seu papel fundamental. A formação da cultura integral do Ser Humano, a preparação para a vivência colectiva e o estímulo à criatividade foram sendo substituídos gradualmente pela preparação e treino para o mercado de trabalho, pela competição entre pares e pela distinção de elites.

A distorsão do papel da Escola Pública, ao longo de tantos anos, obviamente acabou por também desvirtuar o papel do professor, particularmente do jovem professor que é já formado num quadro de hegemonia cultural adversa aos princípios da Constituição da República.

O professor tem, ainda assim e acima de tudo, sido um resistente. Pois embora tenha de facto vindo a adquirir alguma distância das preocupações do povo trabalhador (particularmente do operariado), não o fez ao ritmo que os governos desejavam e tem-no feito sempre com grande resistência, fruto também do trabalho dos seus sindicatos de classe que entendem a Escola Pública não como coutada de interesses, mas como instrumento de valor nacional.

A Escola Pública é uma estrutura fundamental para a existência de uma democracia, por mais elementar que seja essa democracia. Enquanto não estiver assegurado a todos os portugueses, independentemente da sua condição social ou económica, da sua raça, credo ou conduta moral, o acesso ao conhecimento e à análise crítica, não poderá dizer-se que existe uma democracia, pois que assim toda a decisão popular está inquinada à partida por falta de consolidação racional por parte do povo alheio à educação. Há várias formas de estratificar o acesso ao conhecimento e em Portugal temos experimentado um pouco de todas. As limitações no acesso ao conhecimento mudam consoante as necessidades do capitalismo e do sistema, assim garantido a satisfação dos interesses dos grupos económicos que dominam a política portuguesa.

Vejamos: podemos limitar o acesso à escola propriamente dito, ou limitar a progressão escolar dos mais pobres. Assim, asseguramos uma estratificação bem delineada. Os filhos das camadas mais ricas podem aceder ao Conhecimento, os restantes não. Depois do 25 de Abril, porém, esse esquematismo não poderia continuar a realizar-se de forma tão assumida. Em 1986, a Lei de bases do sistema educativo, vem inclusivamente assumir a massificação do ensino como um desígnio nacional, ainda na senda das conquistas de Abril. As necessidades do sistema capitalista vieram, entretanto a ditar a forma como se procede a essa massificação. Se, por um lado, se pode afirmar que se abriram as portas das escolas a todos, não se poderá dizer que se colocaram todos em pé de igualdade perante a Escola.

A estratificação imposta, particularmente depois da revisão curricular e reforma educativa de Manuela Ferreira Leite, por alturas de 1994, veio a colocar as escolas no caminho do regresso ao passado, assim assegurando o acesso às vias de prosseguimento de estudos apenas para os filhos das camadas mais ricas da população, encaminhando os filhos dos trabalhadores para as vias chamadas "de recurso", eminentemente profissionalizantes. O actual Governo intensificou este ataque à Escola Pública e iniciou a sua profissionalização generalizada. A estratégia do capital já não é a da absorção de mão-de-obra analfabeta e incapaz de utilizar os instrumentos e os meios de produção de hoje. Pelo contrário, o capital anseia agora por novas gerações mais formadas, mais capazes de manipular os meios de produção e as novas tecnologias, sempre na perspectiva de retirar o maior lucro possível dessas capacidades da população. Para tal, precisava de um Governo que, não retirando as massas das escolas, alterasse os objectivos centrais da escola pública. Eis que Sócrates e Maria de Lurdes Rodrigues iniciam a sua política de desestruturação e desfiguração da Escola Pública e fazem-no com uma fúria digna de um regime fascista e dos mais emblemáticos ditadores.

Mantendo a perspectiva massiva da Educação, importa pois assegurar que o Sistema de Ensino cumpre as ordens dos interesses económicos, assim separando à partida os futuros dirigentes, a elite do país, e os futuros assalariados, operários e quadros intermédios. Fica assim, assegurado um processo de ensino diferente em função da classe social alvo.

Esta desfiguração da Escola Pública não poderia, no entanto, ser levada a cabo com os professores que, nas escolas têm desempenhado um papel resistente. O professor português, descendente ou ainda protagonista de uma geração que viveu intensamente as conquistas da revolução e que construiu praticamente por suas mãos a Escola Pública, aplicou os seus esforços na construção de um país cujo povo fosse capaz de concretizar a sua própria emancipação. O sistema educativo português, pesem embora os inúmeros ataques políticos e operacionais que lhe têm sido dirigidos, é um sistema orientado para a emancipação nacional e popular, para a estruturação de um país, com base no conhecimento e na consciência individual e colectiva do seu povo. E o professor português é um elemento dessa criação, é aliás um dos pilares dessa construção gigante e audaz que é a Escola Pública. Para alterar as características primordiais e essenciais dó nosso sistema de ensino, é portanto incontornável que se alterem as características dos seus professores.

Daí a importância obsessiva que este Governo coloca no ataque aos direitos dos professores, daí a força com que impõe um regime de carreira hierarquizado, baseado na obediência e no desempenho meramente material do trabalho de professor, esmagando as dimensões humanas do trabalho de ensinar, as dimensões pedagógicas, emocionais, ignorando as disparidades de classe e entre escolas e diferentes realidades, fazendo tábua rasa Constituição da República Portuguesa e, simultaneamente, promovendo o Ensino Privado. Por tudo isto, a luta dos professores é uma peça central da luta mais vasta pela soberania popular, soberania que não será possível enquanto aos trabalhadores estiver reservado o papel de espectador político e escravo laboral. E só com uma Escola Pública Gratuita, Democrática e de Qualidade para todos, poderá o trabalhador português assumir o seu pleno papel na construção do progresso social do país e do mundo.

terça-feira, 17 de março de 2009

Presta - contas Educativo

Tentando eliminar repetições a reapresentações:

Projecto de Lei 663/X
Institui um regime especial de aposentação para educadores de infância e professores do 1.º ciclo do ensino básico do ensino público em regime de monodocência que concluíram o curso de magistério Primário e educação de Infância de 1975 e 1976.
PS, PSD, PCP, CDS-PP, BE, Ninsc

Projecto de Lei 634/X
Estabelece o regime de aplicação da Educação Sexual nas Escolas.
PCP

Projecto de Lei 633/X
Sétima alteração ao Decreto-Lei n.º 125/82, de 22 de Abril, que regula a composição, competência e regime de funcionamento do Conselho Nacional de Educação.
PS, PSD, PCP, CDS-PP, BE, PEV

Projecto de Lei 608/X
Segunda alteração à Lei n.º 30/2002, de 20 de Dezembro, que aprova o Estatuto do Aluno do Ensino Básico e Secundário, alterada pela Lei n.º 2/2008, de 18 de Janeiro.
PCP

Projecto de Lei 602/X
Regime Jurídico da Educação Especial.
PCP

Projecto de Lei 500/X
Cria os Gabinetes Pedagógicos de Integração Escolar (GPIE).
PCP

Projecto de Lei 458/X
Gestão democrática dos estabelecimentos de educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário.
PCP

Projecto de Lei 347/X
Determina a realização de concurso para a selecção e recrutamento do pessoal docente da educação pré-escolar e dos ensino básico e secundário para o ano lectivo de 2007/2008.
PCP

Projecto de Lei 82/X
Alarga a aplicação do Decreto-Lei n.º 234/97, de 3 de Setembro, aos docentes contratados das escolas públicas de ensino especializado da música.
PCP

Projecto de Lei 59/X
Alteração à Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro, na redacção dada pela Lei n.º 115/97, de 19 de Setembro).
PCP


Projecto de Lei 47/X
Alteração à Lei n.º 5/2001, de 2 de Maio, que considera o tempo de serviço prestado na categoria de auxiliar de educação pelos educadores de infância habilitados com cursos de formação a educadores de infância para efeitos da carreira docente.
PCP

Projecto de Lei 37/X
Altera o regime de constituição e os direitos e deveres a que ficam subordinados as associações de pais e encarregados de educação.
PCP

Projecto de Lei 200/X
Regula o exercício do direito de Associação dos Estudantes.
PCP

Projecto de Lei 82/X
Alarga a aplicação do Decreto-Lei n.º 234/97, de 3 de Setembro, aos docentes contratados das escolas públicas de ensino especializado da música.
PCP

Projecto de Lei 655/X
Regime de apoio à frequência de Estágios Curriculares.
PCP


Projecto de Lei 609/X
Define o regime de certificação e adopção dos manuais escolares, garantindo a sua gratuitidade.
PCP

Projecto de Lei 603/X
Alargamento da Escolaridade Obrigatória para 12 anos, (terceira alteração à Lei de Bases do Sistema Educativo, aprovada pela Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro e alterada pelas Leis n.º 115/97, de 19 de Setembro e n.º 14/2005, de 30 de Agosto).
PCP

Projecto de Lei 484/X
Elimina a prova de avaliação de conhecimentos e competências do concurso para lugar do quadro de ingresso na carreira docente (oitava alteração ao Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário - aprovado pelo Decreto-Lei nº 139-A/90, de 28 de Abril).


Projecto de Lei 159/X
Atribui o direito a subsídio de desemprego ao pessoal docente e investigador contratado por instituições do ensino superior e de investigação públicas.
PCP

Projecto de Lei 112/X
Criação da Universidade de Viseu.
PCP

Projecto de Lei 82/X
Alarga a aplicação do Decreto-Lei n.º 234/97, de 3 de Setembro, aos docentes contratados das escolas públicas de ensino especializado da música.
PCP

Projecto de Lei 59/X
Alteração à Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro, na redacção dada pela Lei n.º 115/97, de 19 de Setembro).


Projecto de Resolução 397/X
Suspensão da aplicação do regime de avaliação do desempenho de professores previsto no (Decreto Regulamentar n.º 2/2008, de 10 de Janeiro)
PCP

Projecto de Resolução 373/X
Medidas para a dinamização do sistema científico e técnico nacional.
PCP

Projecto de Resolução 342/X
Reforço de dotação para o funcionamento dos estabelecimentos do ensino superior
PCP

Projecto de Resolução 271/X
Cessação de vigência do Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de Janeiro. (Ensino Especial)
PCP

Projecto de Resolução 264/X
Estabelece um processo de apreciação e discussão parlamentar do regime de avaliação da actividade docente.
PCP

Projecto de Resolução 214/X
Recomenda ao Governo medidas de intervenção no sistema de ensino público no sentido do combate à violência em contexto escolar e do reforço do da escola inclusiva e democratica.
PCP

Projecto de Resolução 171/X
Recomenda ao Governo que mantenha as instalações da Escola Secundária D. João de Castro como espaço público dedicado à educação.
PCP

Projecto de Resolução 167/X
Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 147-A/2006, de 31 de Julho.
PCP

Projecto de Resolução 92/X
Comemoração dos 20 anos da aprovação da Lei de Bases do Sistema Educativo.
PS, PSD, PCP, CDS-PP, BE, PEV

Projecto de Resolução 47/X
Pela criação de um programa de promoção, expansão e qualificação do ensino da língua e da cultura portuguesas no estrangeiro.
PCP

Projecto de Resolução 32/X
Aprova o estatuto do pessoal docente do ensino especializado da música e da dança.
PCP

Projecto de Resolução 21/X
Visa a não realização dos exames nacionais do 9.º ano.

Projecto de Resolução 335/X
Recomenda ao Governo a criação e aplicação do Programa Nacional de Desenvolvimento Desportivo.
PCP

Projecto de Resolução 310/X
Plano de Intervenção para a Educação Física e Desporto em Meio Escolar.
PCP

PCP = 36 iniciativas legislativas sobre Educação e mais de 300 Perguntas e Requerimentos ao Governo que fui capaz de contar numa breve pesquisa ao site do Parlamento.
Aproveito para chamar a atenção para o facto de o CDS-PP usar uma forma de enganar a estatística, apresentando o mesmo requerimento às 308 autarquias portuguesas, o que faz com que cada requerimento que apresenta, conte como 308.


Depois disto, aproveito para perguntar por que raio continua a ser o Bloco de Esquerda o partido chamado a falar à comunicação social a propósito de tudo e mais alguma coisa sobre educação?
ainda hoje, nos noticiários da Antena 1, toda a manhã falou a menina Ana Drago, como se inultrapassável defensora dos direitos dos professores se tratasse a propósito, pasmemos, de um requerimento de chamada da Ministra da Educação que o BE quis fazer crer da sua autoria, mas que era, na verdade da autoria do PSD. Partido que, tal como os restantes, não foi sequer chamado a dizer uma palavrinha sobre a matéria: era preciso fazer brilhar a estrelinha Ana Drago...

sexta-feira, 13 de março de 2009

Miguel Sousa Tavares

Por vezes lamento não ter muito tempo para escrever. Ainda ontem, enquanto via uns minutos de televisão levei com um chorrilho de asneiras pedantes de um tal de Miguel Sousa Tavares.
O que me irrita nestes "comentadores" de tudo e coisa alguma é que são suficientemente inteligentes para saberem que estão a mentir.

Embora, confesso, no caso deste senhor, eu comece a duvidar. É que regra geral, encomendam estes encartados e iluminados para nos enfiarem com opiniões pela cabeça abaixo, de preferência já mastigadas e prontas a assimilar. Neste caso, isso não é diferente. O MST foi transportado em ombros desde cedo pela comunicação social, mostrado como um apartidário moderado, um intelectual de grande calibre e, essencialmente, um homem sensato que julga tudo por si próprio, fazendo uso da sua potência cerebral.

Mas ou este indivíduo é muito, mesmo muito mal intencionado e não tem outro objectivo senão defender o governo e o sistema tal qual como está, ou então é absurdamente estúpido.

Deixo apenas duas ou três notas.

Com o ar senhorial que lhe é característico, de quem tem um ego muito maior do que o estúdio de televisão onde o enfiam, MST lá vai debitando a cassete de propaganda do governo, com um tom pseudo-independente. Que na educação tudo estava no caminho certo, que pena era o Governo não ter conseguido ir mais longe e que as reformas eram bem intencionadas, etc. Uma vez mais, que os professores não podiam continuar na posição retrógrada de defender a Escola Pública de Abril que isso é coisa do passado, como aliás, é o próprio 25 de Abril.

Também dizia que o governo governava geralmente bem, e que o que havia eram mal-entendidos e incompreensão popular do programa e da agenda reformista do governo, principalmente na área da saúde.

Mas a que mais pasmou, foi a tirada genial sobre a segurança social. Anunciava com desfaçatez e sem pingo de vergonha o tal de MST que estava contente porque daqui a vinte anos os portugueses iam poder receber uma reforma inferior àquela a que hoje têm direito. Eis que o homem se regozijava com o facto de os portugueses num futuro não tão distante, poderem vir a receber de pensão de reforma muito menos do que aquilo que merecem face aos descontos que fazem ao longo de uma vida de trabalho. Mas não era assim tão rude, o homem ainda tem algum requinte. Dizia então que estava contente com esse anúncio dos jornais porque isso era um óptimo sinal, pois a segurança social podia finalmente assegurar reformas e pensões. Porque, segundo ele, antes desta divina intervenção do governo português, a segurança social estava na rota da falência e não tinha condições de assegurar as pensões futuras.

Aqui começamos a questionarmo-nos sobre as intenções de MST. Isto para não termos de questionarmo-nos sobre a sua capacidade lógica. Na verdade, não lhe faltando massa cinzenta, o que lhe falta, e muito, é honestidade. Ora, hoje é mais que sabido e está mais que provado que a chantagem política que o Governo fez em torno da sustentabilidade da Segurança Social foi mero pretexto para cortar nas reformas e pensões e que a Segurança Social apresenta um substantivo superavit, coisa rara nos dias que correm.

Ora, depois de ter sido claramente desmascarada a mentira do Governo, depois de se saber que o dinheiro da Segurança Social (dos trabalhadores portugueses) tem sido usado pelos governos para tudo e mais alguma coisa, para financiar formação profissional, para entregar a bancos e especuladores, para usura, para salvar empresas em apuros, para pagar subsídios de desemprego de falências fraudulentas, etc., vem este MST armado em carapau de corrida dizer que está contente porque as pensões e reformas baixaram para garantir a sustentabilidade da segurança social, depois de se ter tornado óbvio até para quem não quer ver que a segurança social nunca teve problemas de sustentabilidade e pelo contrário, até tem servido como almofada aos governos que gastam o que podem e o que não podem. Aliás, não é por acaso que o Estado é quem mais deve à Segurança Social, acumulando dívidas gigantes devidas aos trabalhadores portugueses. E vem-me aquele tipo que teve uma vida de santo, que deve ter um salário de santo e um PPR divino, que deve ganhar dinheiro à custa das mentiras que diz, gozar na cara dos portugueses que trabalham uma vida inteira para no fim terem uma pensão miserável.

É preciso descaramento. E mais que isso, é preciso desonestidade intelectual e política. Coisa que, por mais que as tvs e jornais queiram, nunca hei-de atribuir a esse senhor.

Aliás, MST estava com um ar muito altivo dizendo estas barbaridades como se toda aquela análise viesse da sua própria cabeça e não estivesse a fazer fretes a ninguém. Mas curiosamente, no canal para que mudei por já não o poder aturar, um analista menos famoso, daqueles mais descartáveis mas igualmente sabujos, dizia exactamente o mesmo, com os mesmo argumentos. Lá se foi a originalidade e a racionalidade "acima de qualquer suspeita" de MST.

quinta-feira, 12 de março de 2009

88 anos de luta

Por que escrever 88 anos passados da fundação do Partido Comunista Português? Por que continuam os comunistas portugueses a comemorar o aniversário do seu Partido, a cada ano que passa, como aliás mais nenhum partido o faz?

É pois um desses enigmas que muitos não compreendem ou fazem por não compreender. É também uma das muitas provas de seriedade que os militantes comunistas prestam regularmente, independente do que fica bem dizer-se, do que fica bem esconder-se. Enquanto uns escondem a história do seu partido, outros ignoram-na por ser demasiado enfadonha, enquanto outros ainda preferem não perder qualquer minuto de atenção mediática lembrando o passado, os comunistas insistem em valorizar o seu. Porquê?

Agora, neste mês em que passam 88 anos após o 6 de Março de 1921, os comunistas portugueses relembram a sua história. Não escondem, nem nunca o farão, o nome do seu partido, a cor da sua bandeira, o património da sua luta. Não precisam branquer o passado, porque dele se orgulham. Partido, Comunista e Português são características que são hoje o que são, apenas pelo passado que lhes dá origem. É que este Partido não se reconstrói diariamente ao sabor do mediatismo, não produz posições política à medida dos telejornais, não altera o seu comportamento por imposições exteriores, antes pelo contrário, constrói-se com base na solidez das suas posições e alicerçado na coerência colectiva. Este não é um Partido como os outros e é isso que conta, afinal de contas.

Neste Partido, a mudança de caras não significa a alteração das suas posições políticas, da sua análise, da sua forma de intervenção, porque ele espalha as suas raízes na luta do povo português e dos trabalhadores. Por isso aqueles que esperam do PCP mutações e transgenismos espontâneos e fulminantes, se desiludem diariamente. Por isso é tão importante para os comunistas comemorar o seu passado. Pelo simples facto de que as nossas características são o fruto de um processo histórico, de um encadeamento de acontecimentos, porque o nosso presente assenta no nosso passado e é isso que nos assegura confiança no futuro.

domingo, 8 de março de 2009

Setúbal

Uma reportagem televisiva alertou ontem, num canal da sic, para a situação de decrepitude que se vive na cidade de Setúbal. Setúbal é a nossa cidade e vê-la tratada assim, como se de um filme se tratasse, magoa-nos e revolta-nos.

Claro que a reportagem usou o habitual estilo televisivo, amplificando significativamente a verdadeira dimensão dos problemas. Claro que se tentou passar uma imagen da cidade ainda pior do que aquela que, de facto, por cá se vai verificando. Na televisão, a repórter anunciava com dramatismo que a partir das 19.00h não era seguro passear nas ruas da baixa de Setúbal. E por detrás da repórter, as belas ruas da nossa cidade apareciam como já nos habituámos a vê-las, desertas, sozinhas e desamparadas. Os comerciantes aproveitaram a câmara de televisão para desabafar sobre os perigos que enfrentam, sobre os assaltos que sofreram. E todos em nossas casas nos revoltámos porque aquela que ali estava no televisor era a nossa cidade.

É verdade que a criminalidade em Setúbal tem vindo a sentir-se com mais intensidade. É, infelizmente, verdade que muitos têm já receio ao caminhar pelas ruas escuras da cidade e que o medo espreita, cavalgando o pânico que se espalha. Os comerciantes fecham as lojas mais cedo, não só por causa da crime, claro está, mas porque a cidade de Setúbal há muito que centrou as suas actividades comerciais na periferia e porque hoje em dia demoramos 15 minutos a chegar ao Montijo ou a Almada, onde existem centros comerciais que secam tudo à sua volta. Os comerciantes fecham mais cedo porque a baixa de Setúbal não consegue competir com a oferta avassaladora dos grandes grupos económicos, porque as lojas da baixa da cidade estão desajustadas do tempo em que nos encontramos, porque os cafés pouco inovaram, porque as lojas de confecções estagnaram, mas também porque a cidade é uma das mais socialmente deprimidas do país.

Inserida numa região desde há muito fustigada pelo desinvestimento, abandonada pelo Poder central, castigada pelo poder político e pelo poder económico, a região peninsular de Setúbal foi sempre uma das mais densamente povoadas do país e sempre das menos financiadas. Não existe investimento público na região, e o tratamento político que é dado a todas as vertentes da vida na península de Setúbal e particularmente na cidade é o mesmo que se dá a um balde de lixo. A cultura na região é ignorada ou sub-financiada (basta comparar as verbas de que dispõe ao longo dos anos o Festróia com qualquer outro festival de cinema do país); a natureza é utilizada para satisfazer caprichos dos ricos ou então para servir de substrato para a indústria extractiva (basta olharmos para as construções que vão surgindo em plenas áreas protegidas, sejam elas Reserva Natural do Estuário do Sado ou Parque Natural da Arrábida, bem como para as pedreiras que comem diariamente a Serra do Risco e a da Arrábida - e como se tal não fosse o suficiente, ainda presentearam o povo de setúbal com a co-incineração de resíduos industriais perigosos para agradar a uma cimenteira); a segurança dos cidadãos é desprezada (basta reparar que na cidade de Setúbal há 1 polícia para cada 400 cidadãos, metade da média nacional que, já de si, é má) e as condições de vida, o emprego, os salários e os direitos laborais são nesta região autênticas esmolas dadas aos trabalhadores.

A degradação da qualidade de vida dos setubalenses é fruto de um constante e prolongado desinvestimento por parte do Poder Central, por parte dos sucessivos governos. Agravado pelo facto de termos sido flagelados por 16 anos de poder autárquico à moda de Mata Cáceres (presidente da Câmara pelo PS - que ningúem esqueça a desgraça que nos trouxe), está também este comportamento dos governos que considera que os cidadãos de setúbal são homens e mulheres inferiores, para quem o direito às infra-estruturas do Estado, aos serviços públicos, ao investimento público e ao Trabalho, são menos importantes que os dos cidadãos das restantes áreas urbanas do país. É altura de pôr fim a esta política de segregação que coloca Setúbal no plano de cidade menor, como se de um arredor de Lisboa se tratasse. A proximidade com a capital deve passar a ser uma mais-valia e não um castigo.

Por isso é urgente exigir que os Governos entendam a cidade como um importante pólo, repleto de potencialidades nas mais diversas esferas da vida social e económica, que se coloque Setúbal no mapa do investimento público central e que cesse a política de excomunhão da cidade do território nacional como se tem vindo a fazer ao longo das últimas décadas.

O povo de Setúbal é diariamente discriminado por sempre ter sido uma população de esquerda. Castigado por ter experimentado as cooperativas, por ter grande vida associativa, por ter milhares de jovens trabalhadores conscientes, por ter agarrado o 25 de Abril com as mãos e ter arriscado construí-lo. Mas é hora de denunciar esta estratégia de desinvestimento levada a cabo quer pelo PS, quer pelo PSD e CDS. A estratégia de isolar Setúbal para poder culpar o seu próprio povo está hoje à vista.

Em Setúbal, precisamos de polícia, é certo. E não daquela que aparece armada até aos dentes em carrinhas azuis e que no dia seguinte de manhã desaparece. Precisamos de polícia, é certo. Mas não daquela que nos enfia o holofote do helicóptero pela janela de casa adentro só para acusar presença. Precisamos de polícia permanente, aqui colocada, como mecanismo de vigilância e segurança da cidade e da população. Polícia de proximidade. Em Setúbal precisamos dessa polícia, mas não só. Precisamos de emprego, de serviços públicos, de melhores escolas, de centros de saúde, de acessibilidades e de capacidade efectiva de gestão do território, nomeadamente o da frente ribeirinha, precisamos de investimento e de melhor cobertura dos serviços sociais do Estado, precisamos de apoio ao associativismo juvenil, de estímulos ao turismo regional, de apoio à pequenas e médias empresas. Em Setúbal precisamos de tudo isso, porque não é só a ausência de polícia que abre espaço à violência.