quarta-feira, 19 de setembro de 2012

"trabalho de massas, resistência de massas, frente única, nenhuma aventura"

A frase que dá título a este texto é a fórmula afirmada por Dimitrov perante o tribunal fascista alemão quando acusado pelos nazis de ter ateado o fogo no reichstag que acabou por contribuir em grande medida para a ascensão do Partido Nazi ao poder.

Essa fórmula referia-se à táctica comunista perante o fascismo. O mesmo Dimitrov que sintetizou tão bem esta orientação geral do movimento comunista internacional nos anos 30 do século XX, descreveu o fascismo como uma expressão plena do regime de exploração que caracteriza o capitalismo. Nesse entendimento, a própria democracia burguesa é uma concessão do capitalismo à força dos povos - ou seja, a besta fascista é o verdadeiro rosto do capitalismo, embora nem sempre vísivel e muitas vezes dissimulado.

Porque invoco hoje essa consigna comunista?

Porque o momento histórico que atravessamos, também em Portugal, é o de agudização da exploração, de intensificação da receita capitalista, o da capitulação da burguesia nacional e do poder político perante a burguesia transnacional e o poder imperialista europeu e franco-alemão. A negociação dessa capitulação é feita de forma a salvaguardar os privilégios da burguesia nacional e dos grandes grupos económicos que a sustentam, ainda que conjugados com o avanço triunfal da influência da grande burguesia transnacional e dos impérios capitalistas.

Essa intensificação dos mecanismos capitalistas de exploração é feita também através da desfiguração do Estado tal como concebido pela Constituinte resultante da Revolução e pela restituição de um Estado ao serviço do monopólio, aproximando-se perigosamente de instrumento preferencial e exclusivo da classe dominante. É certo que todo o Estado é instrumento opressor da classe dominante sobre as classes exploradas, mas não é errado caracterizar o Estado resultante de Abril como um Estado em transição do Capitalismo para o Socialismo, com reflexos também nas relações sociais e na composição da propriedade que esse Estado albergava. Por isso mesmo, pode afirmar-se que presenciamos um retrocesso na configuração política do Estado, no sentido inverso ao estabelecido na Constituição da República Portuguesa.

Essa desfiguração do Estado, por sua vez, coloca a evolução da situação nacional no sentido da regressão social, reconstruíndo privilégios e poderes, fascizando o Estado, as relações laborais, e a hegemonia.

A capitulação e a venda do país, acarreta o sacrifício interminável dos direitos e conquistas económicas, políticas e sociais dos portugueses. Só a rejeição desse rumo pode recolocar o país no caminho do progresso e da democratização. Quando Álvaro Cunhal colocava a consolidação da democracia política e das liberdades políticas em primeiro plano e em íntima ligação com o aprofundamento das restantes componentes da democracia e da economia, fazia-o porque tinha plena consciência de que a natureza do capitalismo é fascista, desumana, ditatorial, cruel. A relação entre a democracia e a superação do capitalismo é directa e inequívoca.

Por que motivos recuperar agora Dimitrov, Cunhal e Lénine (sobre o papel do Estado)? "Trabalho de massas, resistência de massas, frente única, nenhuma aventura."

A resposta está no título do texto. Porque nestes momentos, ser-nos-ão colocadas questões várias, dúvidas imensas, esperanças múltiplas, ilusões diversas. A resistência é o primeiro passo para o avanço, para a conquista e, por isso mesmo temos afirmado que, neste contexto, "resistir é já vencer" (Jerónimo de Sousa di-lo várias vezes). Mas é importante combater as perspectivas subitacionistas, inorgânicas, aventureiristas que desligam a preponderância da hegemonia cultural no contexto. A frente única contra a fascização, o trabalho de massas - mesmo de massas - e a resistência de massas - mesmo de massas - não podem ser reduzidos a expressões mais ou menos violentas, mais ou menos concretas, mais ou menos massivas. A luta pela luta, a revolta sem alvos, são passos pelo pântano adentro.

A concepção de trabalho de massas, de resistência de massas, de frente única, parte da organização do operariado enquanto classe, organizado para resistir e para afirmar o seu domínio sobre a burguesia. A frente única coloca a evidência de construir uma política de alianças (não de partidos, mas de camadas) que aceite a direcção da luta pelo proletariado como forma única de retaliar a agressão capitalista e a reconstituição do fascismo.

1 comentário:

filipe disse...

Distinção importante, decisiva. A luta, a luta realmente transformadora, é contra a política DAS DUAS TROIKAS, a externa e a interna.
Muitas declarações, muita conversa, muitos debates e análises, mais reuniões institucionais, tudo para mascarar as soluções que neste momento o grande capital (interno e externo) já terá em andamento, evidentemente com o envolvimento directo do PS (com o BE à ilharga), este talvez de novo muito "violentamente" abstencionista, quem sabe?
Urge promover/congregar/organizar tal "frente única", apontando-lhe os objectivos e as formas orgânicas que lhe permitam vingar e constituir-se como solução de poder. Contra os propósitos e os crimes continuados dos componentes da Troika liquidacionista e traidora - PS/PSD/CDS - acobertados por um PR violador dos seus deveres constitucionais que, entre outras hilariedades, "viu" as vacas sorrirem-lhe...