Uma das manobras habituais e sistemáticas da manipulação ideológica e comportamental, componente central da propaganda dos governos de direita e do próprio capitalismo, é a da criação de uma barreira ilusória entre os interesses dos trabalhadores.
A utilização desse mecanismo de divisão terá certamente estado na origem do velho ditado "dividir para reinar", que ainda hoje se mostra relativamente acertado.
Um dos métodos, que tanto tem por aí ganho terreno e que se camufla de "justiça social e equidade" é o que consiste em criar a ideia de que os trabalhadores devem pagar os serviços públicos. Dizem-nos que "quem tem posses deve pagar e não deve pesar nos custos do Estado".
Por exemplo, quem pode deve pagar propinas, quem pode deve pagar taxas moderadoras, quem pode deve pagar o preço do passe na totalidade em função dos custos, etc.. E com isto dizem-nos, sem que nos apercebamos, que tudo deve ser pago por todos, assim reservando a quem pode pagar o acesso a esses serviços. Essa é que a questão.
Por duas vias nos enganam com esta conversa da "ética social na austeridade":
1. por um lado, ao criar uma barreira, um limiar de vencimentos abaixo do qual se pode de facto aceder gratuitamente ao serviço. Por esta via, abrem a primeira brecha na própria gratuitidade. Por esta via, abrem a primeira porta ao pagamento do serviço, colocando a questão política na definição do valor abaixo do qual se é "desfavorecido" e não na verdadeira questão política que é a gratutidade do serviço, pago pela via dos impostos. A justiça no acesso aos serviços não pode ser assegurada através de um pagamento ou de uma taxa, mas sim através dos impostos, através da justiça fiscal. Ou seja, o mais rico paga mais impostos. O mais pobre paga menos impostos. E assim deixa de chocar quem quer que seja o facto de os ricos poderem aceder gratuitamente ao SNS, ao Ensino Superior ou a qualquer outro serviço público prestado pelo Estado. É aliás, a gratuitidade para o rico que garante a gratuitidade para o pobre.
2. por outro lado, a criação dessa divisão entre quem "pode pagar" e "quem não pode pagar" gera uma abordagem absolutamente contrária à da perspectiva constitucional de Abril, quebrando a unidade popular e quebrando a solidariedade do Estado. Com esta quebra, não apenas se sacrifica a constituição da república, mas sacrifica-se, essencialmente a camada laboriosa da população, salvaguardando as camadas exploradoras que poderão, garantidamente, continuar a aceder a todos os serviços públicos ou privados. Aliás, com estas medidas, essas camadas exploradoras não só poderão continuar a aceder a todos os serviços como garantem um sem fim de privilégios, já que deixam de financiar o Estado. Ou seja, ao não colocar nos impostos a garantia da justiça social, a classe dominante guarda para si a porção do contributo que devia entregar ao Estado para o cumprimento das suas funções sociais.
Daí que seja cada vez mais importante afirmar que os teus direitos são os meus direitos.
O teu direito a estudar é o meu direito ao desenvolvimento e ao progresso.
O teu direito à água é o meu direito a um ambiente sadio e à vida.
O teu direito à saúde é o meu direito à saúde.
O teu direito ao subsídio de desemprego é o meu direito a um salário.
O teu direito a circular numa autoestrada é o meu direito ao desenvolvimento regional e à dinamização da economia.
O teu direito de lutar é o meu direito a viver melhor!
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