sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Existem classes? um exercício de Vasco Pulido Valente

Há um senhor que dá pelo nome de Vasco Pulido Valente que é, em todos os aspectos, uma figura repugnante do nosso elenco de comentadores de encomenda e que se atreve a vomitar a sua ignorância voluntária com grande frequência nos canais de televisão e nos jornais portugueses, donde destaco o "público", onde deixou no dia 11 de setembro um autêntico exercício de estupidez.

Ora vamos tentar ser minimamente organizados na resposta.

1. Diz VPV que ficou espantado com o facto de Jerónimo de Sousa falar de classes. Diz ele que classes não existem e que são apenas fruto retórico de uma tentativa de reabilitação de Marx na contemporaneidade. Muito bem. É uma opinião que carece de fundamentação... adiante.
Como justifica VPV que classes são coisa que não existe? Começa, para variar o estilo de manipulação que a direita habitualmente usa, por mentir e atira mesmo a seguinte pérola: "para começar, convém esclarecer que Marx nunca definiu o que fosse uma "classe". Nem ele, nem Engels, nem Lenine, nem depois ninguém."

Ora vejamos: ou o homem é de todo ignorante e acha que pode falar de coisas sobre as quais, manifestamente nem se deu ao trabalho de estudar, ou é tão abominável que julga estar imune ao julgamento crítico dos portugueses minimamente informados. Então o homem não sabe que Marx define "classe" de forma absolutamente objectiva em função da relação do indivíduo/grupo com o sistema produtivo? Marx vai ainda mais longe e apresenta uma definição para cada uma das classes, tal como Engels também reitera em várias obras. Para que fique claro o conceito marxista de classe: "conjunto de indivíduos que ocupam o mesmo lugar no sistema produtivo em função da posse ou não dos meios de produção". Por isso, Marx esclarece já no século XIX (vejam bem o que o VPV anda a perder - séculos de história) que o proletariado é o conjunto de homens e mulheres que não detém parte alguma dos meios de produção e que dispõe única e exclusivamente da venda da sua força de trabalho para sobreviver. Da mesma forma, a burguesia é precisamente o conjunto dos indivíduos que detém parte ou totalidade dos meios de produção e que, como tal, explora a força de trabalho do proletariado.

Marx e Engels vão bem mais longe e introduzem definições de classes como os artesãos, os camponeses, distinguem a pequena-burguesia da grande burguesia, etc. mas nada disso importa quando se quer atirar umas atoardas anti-comunistas. O que importa é mentir e ver se se engana mais uns. VPV demonstra bem a essência do intelectual vendido ao sistema, embrenhado na rede da classe dominante, que ele, tanto como eu, bem sabe existir. Faz é parte da sua tarefa de difusão doutrinária, negar a existência das classes. Que melhor forma de manter o sistema de classes bem hierarquizado senão a de manter os explorados inconscientes da sua condição?

2. Certamente de forma deliberada, pois que de VPV julgo muita coisa, mas não lhe atribuo a condição de mentecapto, introduz uma confusão de conceitos. Diz então que na definição de classes não cabe a chamada "classe média" e usa essa suposta falha da definição (que ainda há momentos não existia, repare-se) para justificar a inexistência de classes. Ora bem sabe VPV que o conceito de "classe média" que ele tenta introduzir para gerar alguma entropia nos mais incautos integra-se num esquema de classes bem distinto daquele a que Marx se refere como "classe social". Na verdade, tudo depende da linguagem, dos conceitos que usamos. Não podemos é misturar alhos com bugalhos. E foi isso que VPV fez. Os conceitos absolutamente difusos de "classe média", "classe baixa", "classe alta" e todos os seus intermédios são apenas indicativos do rendimento do indivíduo e não remetem em momento algum para a sua real condição no sistema produtivo. Ou seja, "classe alta" ou "classe média" ou "baixa", não são "classes sociais" são apenas conceitos vagos que apontam para o grau dos rendimentos. Curiosamente, esse conceito introduzido pelos sociólogos do capitalismo é que é flagrantemente amorfo. A partir de que salário sou da "classe alta"? qual é o valor objectivo? e para o ano, tendo em conta a inflação ainda pertencerei à mesma classe? Para os marxistas, "classe social" é um conceito objectivo e bem delineado. Ora, existem hoje "pessoas que ocupem o mesmo lugar no sistema produtivo?" Existem hoje "pessoas que dependam exclusivamente da venda da sua força de trabalho para sobreviver, não dispondo de posse de meios de produção em todo ou em parte"? Existirão "pessoas que detêm parte ou totalidade dos meios de produção e que exploram a força de trabalho das restantes"? Então... não percebo o raciocínio inquinado de VPV.

3. A ideia de VPV de que "a partir de 1980-1990 uma sociedade mais complexa criou uma gradação contínua, em que é difícil distinguir um grupo fixo ou uma hierarquia clara" é pois, absolutamente falsa. As relações e os posicionamentos perante o sistema produtivo mantêm-se tal e qual estavam no início do século, com a diferença única na melhoria das condições de vida de uma parte do proletariado (particularmente a mais afastada do processo produtivo materialmente considerado), que vendo os seus salários crescer significativamente, perde a consciência política do lugar de classe que ocupa. Essa camada de proletários, onde se incluirá um bom conjunto de capatazes, gestores, chefias e outros postos de direcção inetrmédia, serve directamente os interesses da burguesia porque os seus interesses materiais são beneficiados com essa relação de submissão.

4. VPV torna a mentir quando afirma que "Jerónimo de Sousa não se apresenta hoje como o representante de nenhuma "classe" em particular. Fala de maneira geral em trabalhadores, contribuintes, desempregados." Enfim, àparte a rebatida e evidente tentativa de atirar areia para os olhos do leitor, introduzindo conceitos que nada têm a ver com classes sociais (contribuintes e desempregados, por exemplo), VPV mente porque sabe bem que Jerónimo de Sousa pertence ao único partido português que se afirma como "partido de classe" porque identifica o proletariado, os trabalhadores portugueses, como a classe que é fulcro da sua intervenção, pese embora como é natural, reconheça noutras classes sociais interesses comuns com os trabalhadores e por isso mesmo lance o apelo para a convergência de classes anti-monopolistas.

5. A melhor das pérolas que sai da pena de VPV, porém, chega-nos no final do seu execrável texto de manipulação e de mentira. Diz então: "Se existissem "classes", como julga Jerónimo de Sousa, ele não perderia um minuto a discutir com Ferreira Leite o investimento público ou o défice do Estado, pela razão simples de que Portugal e a Europa estariam perto de uma sublevação." Confessou o seu medo mais profundo, VPV neste fantástico trecho. Todo o mundo está em convulsão, por todo o mundo sublevações populares de naturezas várias põem em causa o "modelo ocidental" e as ditaduras criadas pelos impérios da modernidade. Partindo do princípio que o senhor, com sublevação, se referia a levantamento popular, é bom que olhe à volta e sinta o descontentamento e a força latente de um povo que, cada vez mais, busca formas de se sublevar. O dia virá em que VPV, oportunista opinador como se tem demonstrado, ainda virá dizer que afinal existem classes. Só espero que esse dia venha lesto, para lhe podermos todos enfiar com as classes nas ventas.

A luta continua!

2 comentários:

VASCO disse...

O dia virá...

Bruno disse...

"Marx e Engels vão bem mais longe e introduzem definições de classes como os artesãos, os camponeses, distinguem a pequena-burguesia da grande burguesia, etc."

Há alguma obra (de Marx ou Engels) onde essas definições estejam expostas de forma directa? Do que li, se bem me lembro, esses conceitos eram colocados e contextualizados quanto à sua origem, ...não me lembro de nenhum deles se alongar naquilo que distingue artesãos, camponeses ou a pequena e grande burguesia.

Não que seja difícil compreender as diferenças, mas fiquei com a curiosidade, e talvez alguém aqui me possa responder à minha questão.

abraço