Andam por aí os do costume a navegar na corrente dos protagonismos, na sua incessante busca pela espuma dos dias da política, em todas as frentes, sem excepção.
É verdade que a Água, bem como a Águas de Portugal, SA devem ser estritamente públicas e geridas directamente por organismos públicos. Aliás, a luta contra a privatização da água começa há muito tempo atrás, desde alturas em que dela não se falava. Quando o Governo de Sócrates tudo fazia pela calada, escondendo as suas reais intenções, já desde 2005, apenas o PCP falava e mobilizava - fora da agenda mediática que tudo quer ditar - contra a privatização desse recurso.
É a Lei da Água de Sócrates, aprovada em 2005 pelo PS, PSD e CDS que cria as condições legais para a privatização da água, das margens, dos leitos, das albufeiras, das praias, enfim, de todo o domínio hídrico. O Regime Económico-Financeiro e a Lei da Titularidade dos Recursos Hídricos, todos aprovados durante os mandatos PS e Sócrates foram as peças fundamentais para a alienação da água enquanto recurso e da Águas de Portugal, SA enquanto empresa de gestão de águas. Nessa altura, na escuridão mediática, o PCP foi o único partido a apresentar uma Lei da Água alternativa, proibindo a sua privatização e garantindo a sua gestão democrática.
O anúncio do PSD e do Governo Passos Coelho para a privatização da empresa AdP a partir de 2012 não é diferente do anúncio de Sócrates ao dizer que "não será privatizada durante esta legislatura" (referindo-se à sua primeira legislatura - ou seja, remetendo a privatização precisamente para 2012). Porquê 2012, perguntemo-nos? Porque só nessa altura a AdP estará suficientemente interessante para o comprador, dado que enquanto a empresa (holding) não detiver a influência suficiente nas multi e intermunicipais de abastecimento, saneamento e tratamento e enquanto houver investimento público para fazer (curiosamente o PEAASAR II termina em 2012-2013), tal compra seria desastrosa para qualquer privado.
Foi o PSD a anunciar o que a burguesia determinou e PS preparou.
E agora? Agora é preciso lutar, é preciso denunciar os impactos e efeitos que a privatização da gestão da água teve noutros locais do mundo e isso pode ser aprofundado no site da associação pública. É preciso mobilizar e defender a água de todos, como recurso natural de livre acesso.
Mas agora que a luz dos telejornais decidiu fazer-se incidir sobre tal tema, já o BE tem uma medida a propor. Uma desastrosa medida, mas que interessa isso a quem luta pela projecção de um grupelho ao invés de lutar pelo sucesso da causa que diz defender. O BE não compreende, como não compreendeu com a questão da IVG, que há direitos que não podem depender da vontade da maioria, porque não se compadecem com o sistema democrático burguês vigente.
Na minha opinião, desde que uma só mulher quisesse recorrer à IVG teria esse direito, independentemente do que julga a maioria. O BE aceitou que a IVG era matéria referendável. Isso significa que aceita que a vontade moral da maioria se deve impôr perante o indivíduo, mesmo no que toca à sua vida, à sua sobrevivência, à sua sexualidade e ao seu corpo. O BE aceitou, porque lhe convinha e porque confiava no resultado, que a maioria decidisse sobre a vida de cada um e não sobre um destino ou escolha colectiva para o Estado, nação ou país. Aí demonstra também a inconsistência da sua posição sobre o referendo.
E eis que o torna a fazer. O BE sabe que propor um referendo lhe dará destaque, e que se o referendo se realizasse seria um óptimo palco para cavalgar uma luta a que nunca ligou puto. Mas sabe, ou devia saber, que isso não significa que seja o mais correcto a fazer-se para atingir o objectivo e muito menos o mais acertado do ponto de vista político e filosófico, porque a rectidão com que se alcançam as vitórias é factor determinante para o uso que delas viermos a fazer.
Na minha opinião, nem que uma só pessoa fosse contra a privatização da água, a privatização não poderia realizar-se pelo simples facto de a maioria não poder determinar o fim da vida de um indivíduo, ou negar-lhe um direito fundamental. Ou seja, a água é um direito natural que deve ser defendido pela luta natural e não pela imposição da maioria. Porque neste caso, como na IVG, a solução de referendar só é aceitável se o desfecho for conhecido e isso, por si só, demonstra as falhas da doutrina.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
1 comentário:
Muito bom e esclarecedor, este texto.
De facto, não há lugar para referendar seja o que for no que concerne a água.
Abraço.
Enviar um comentário