sábado, 23 de maio de 2009

resposta

Tenho alguma tendência para ser pouco tolerante com a incompetência injustificada, como a que resulta da preguiça, por exemplo. Mas ao que sou mesmo avesso é à inteligência vendida, reptante, e à manipulação consciente da informação, ainda que através de artigos de opinião.

Confesso que já não trago comigo a edição de hoje do jornal Público onde a páginas tantas São José Almeida escreve umas abjectas linhas sobre um tal Projecto de Lei da JS sobre Educação Sexual porque a repulsa que me provocou foi tanta que foi direito para o primeiro caixote do lixo por onde passei ali mesmo no Saldanha (grande marcha!). Por isso mesmo, não terei capacidade para fazer citações neste pequeno texto de "resposta" porque não encontro versão online da mesma peça de SJA.

Ora, a pretexto de um suposto desafio ao Partido Socialista, com um apelo implícito à "resistência" do PS contra as imposições mais conservadoras dos segmentos religiosos da população e suas instituições, SJA invocava o processo de discussão e votação na especialidade do Projecto de Lei da Educação Sexual.

1. SJA refere-se ao Projecto de Lei como "Projecto de Lei da JS"(Juventude Socialista) o que revela em poucas palavras uma rede de mentiras. Vejamos: o Projecto de Lei inicial é do PCP, depois acompanhado pelo PS, ambos baixaram à especialidade. A determinada altura, SJA refere que é a JS que, "cumprindo a tradição", traz novamente este assunto à Assembleia da República, o que é manifestamente falso. Primeiro porque a JS não tem Grupo Parlamentar e não pode ser autora de projectos. Segundo porque o primeiro Projecto até foi do BE (rejeitado), o segundo do PCP(aprovado) e só meses depois surge o do PS (não sem ter adiado por alguns meses o trabalho parlamentar).

2. SJA omite deliberadamente o papel do PCP na construção das leis da educação sexual do país, desde 1982. Consegue mesmo introduzir uma alusão positiva ao BE lembrando o PJL do casamento entre pessoas do mesmo sexo, mas curiosamente esquecendo o único projecto responsável sobre essa matéria que foi apresentado - o dos Verdes (que contou com o apoio do PCP, mas com a rejeição desse grande partido da esquerda democrática que é o PS).

3. SJA só releva o papel do PCP numa infeliz e rasteira passagem do seu texto para criticar (com toda a legitimidade) uma proposta de alteração que o PCP fez na especialidade, propondo que onde se lia "igualdade de género" se passasse a ler "igualdade entre os sexos" (sobre o meu entendimento sobre essa questão, pode ler-se aqui). Ora, SJA diz que essa alteração constituiu um retrocesso, uma importante cedência ao conservadorismo. Acrescenta mesmo que vai contra todas as directivas europeias (?). Ora, a crítica de SJA à opção do legislador é legítima e só tenho mais que a compreender. O que não é de todo legítimo é que SJA refira no mesmo saco o voto da direita e de dois deputados do PS, atire a bujarda ridícula das "boas práticas europeias" e passe ao lado da justificação que eu próprio lhe dei, por telefone, um dia antes da publicação de tão infeliz texto. É que, aparentemente, SJA não gostou da explicação do PCP sobre a alteração de "género" para "sexo" e então fingiu desconhecê-la e colar assim o PCP à direita e à tal ala política do conservadorismo.

Lamentável é, no entanto, que uma jornalista de tão elevada craveira e de tão consolidado reconhecimento público, justifique as suas opiniões com sufismas e axiomas de tal forma superficiais que roçam a inépcia argumentativa, que mental não julgarei. Ora, é minha firme convicção de que a desfiguração e mistificação dos conceitos através da manipulação do léxico é um dos poderosos instrumentos de dominação ideológica do capitalismo. Tal como os "trabalhadores" se converteram em "colaboradores" e os "operários fabris" em "técnicos de linha", "técnicos de montagem" e outros que tais e eu não considero que essa conversão seja progressista, também não considero que a mistificação do "sexo" com a introdução de um conceito subjectivo seja progressista. Na verdade, o facto de a União Europeia estimular esse uso (do "gender", "género") só reforça a minha aversão à utilização do termo na política.

4. Que SJA queira, como tantos outros e bem, utilizar esse termo para avaliações analíticas, sociológicas, psicológicas, ou outras do género em que tal se aplique, tudo bem. O que não se pode pedir é que a legislação passe a incluiur categorias analíticas como conceitos objectivos. Mais que não seja por uma questão de prática legística, o termo "igualdade de género" é absolutamente desadequado por não significar absolutamente nada.
Aliás, se alguém puder, objectiva e coerentemente, explicar-me exactamente o que significa "igualdade de género", eu agradeceria. É que, no mínimo seria sempre "igualdade entre géneros" para que a coisa fizesse o menor sentido. Mas deve ser do meu cérebro retorcido e conservador, pois concerteza.

sexta-feira, 22 de maio de 2009

'tá a andar de mota!

A Assembleia da República discutiu hoje o Projecto de Lei nº 635/X do Partido Comunista Português que facilita o acesso à carta para a condução de motociclos de cilindrada até 125cc.

Numa altura em que o tempo livre é cada vez menor, em que os trabalhadores têm cada vez mais dificuldade em encontrar tempo para o lazer e para as suas famílias, em que se perde cada vez mais tempo nas filas de trânsito, na procura de lugar para estacionar e que se consomem cada vez mais combustíveis, é urgente tomar medidas para facilitar a vida das pessoas.

A Assembleia da República vai aprovar por unanimidade este Projecto de Lei na próxima sexta-feira e esperemos que tenha um processo de discussão na especialidade rápido, para que a lei entre em vigor o quanto antes.

O que o Projecto de Lei propõe é que todos os titulares de carta de condução de carro possam estar legalmente habilitados para conduzir motociclos até 125cc desde que provem que sabem conduzir veículos de duas rodas.

Todos os partidos apoiaram esta iniciativa do PCP.

Resta dizer que esta iniciativa é importante para quem tem moto e para quem quer vir a ter. Pois faz com que quem quer ter moto não tenha de passar pelo calvário das escolas de condução, gastando rios de tempo e de dinheiro. E para quem tem já moto é uma medida fundamental para reduzir a sinistralidade entre motociclos, pois quantas mais motos nas estradas, menor a percentagem de acidentes por moto.

Até à Vitória! (e se for preciso, vamos de moto!)

terça-feira, 12 de maio de 2009

Plágio?

Se fosse um trabalho universitário, tinha zero e ainda levava uma penalização por plágio:

De facto, isto não deveria estar no centro das minhas preocupações. Mas confesso que já vou ficando farto dos sorrisos amarelos, da política de frases feitas e do mediatismo absolutamente injustificado e descabido de quem mais não faz senão reproduzir o trabalho dos outros.

Posto isto, depois de vários exemplos dignos da revolta de todos quantos trabalham e não gostam de ver outros ficar com os louros, descrevo uma situação particularmente flagrante.

Dia 24 de Abril, o Partido Comunista Português entrega na Assembleia da República um Projecto de Lei, cuja epígrafe é "altera o mecanismo da redução da actividade e suspensão do contrato de trabalho - lay-off - reforçando os direitos dos trabalhadores. Esse Projecto de Lei é numerado pela Mesa da Assembleia com o nº 755/X.

pode ler-se aqui.

Dia 3 de Maio, o BE entrega um Projecto de Lei na Assembleia da República com a epígrafe seguinte: "altera o mecanismo da redução da actividade e suspensão do contrato de trabalho, reforçando os direitos dos trabalhadores".

pode ler-se aqui.

Não fosse tão ridículo e eu não me daria ao trabalho. Uma coisa é seguir uma boa ideia do PCP e entregar um Projecto que aponte no mesmo sentido. Outra coisa é a cópia quase TOTAL do projecto apenas para marcar o terreno. Uns têm o trabalho, a discussão colectiva, o aprofundamento teórico, o empenhamento. Outros têm o descaramento de copiar para pôr uma bandeirinha.

Sim, porque ninguém pense que no PCP se apresentam Projectos sem a devida ponderação, o trabalho de discussão e apuramento colectivos. Pelos vistos, no BE, tudo isso é uma chatice... Vale bem mais pegar no que fazem os outros e pôr lá o carimbo do BE.

E o pior... o pior mesmo é que isto é apenas um caso entre muitos. Basta consultar www.parlamento.pt

sábado, 9 de maio de 2009

uma breve resposta (que mais haveria)

Caro amigo,

(que te li aqui)


Sê, pois, bem-vindo à Bela-Vista.

Sabes que a ira poética é compreensível em momentos destes, mas não sejas moralista que não é disso que precisamos para ultrapassar este problema. Acima de tudo, não é de moralismo que aquelas gentes da Bela-Vista precisam para ultrapassar o problema. (e ele há moralismos para todos os gostos, da esquerda ou da direita)


Acima de tudo, não nos dês as boas-vindas a um bairro que não é teu. Não penses que por conheceres este ou aquele(a) que ali já morou que te tornas diferente dos que comem pipocas ou vestem o seu fatinho-saia. Não te tornas diferente só porque ouviste falar da Bela-Vista no discurso directo. Não vejo diferença entre a tua camisa e calça clara e o fato-saia de quem acerta ou não nas palavras.

E aliás também te confesso, que isso pouco me importa porque há quem na Bela-Vista também vista fato e gravata porque o que nos distingue não é que o nos veste, mas sim onde vamos buscar o dinheiro para o pagar.


Digo-te que da minha janela vejo todo o bairro amarelo, passo diariamente por ele para chegar a minha casa. Mesmo assim não conheço a Bela-Vista. Tenho muitos amigos que moram lá e mesmo assim não conheço a Bela-Vista.

Sou sincero: fui duas vezes ao Bairro Azul e ainda hoje não me recompus da visão e da experiência.

Portanto, não estou certamente em condições de prestar sermões, nem de ridicularizar aqueles que nunca viram nada além das pipocas. Não estarei em condições de dar boas-vindas de ninguém à Bela-Vista.


Sei que os que lá moram no-las dão diariamente sempre que lá vamos, sempre que por lá passamos. Sei que toda a gente é bem-vinda à Bela Vista. Infelizmente, há quem se esteja a parasitar do justo sentimento de revolta daquela gente, daqueles jovens, para atirar uns petardos à polícia, grafitar pelo caminho um "a'zinhos de anarquia" e cavalgar a onda anti-policial para a qual o próprio Governo tem contribuído com a orientação sitiante que tem dado às forças policiais neste caso.


Acabo de passar pela barricada policial montada na Bela-Vista. Não nos deixam passar. Nem a nós, nem a ninguém. Os engravatados e as meninas da TV andam por lá à espera que haja mais qualquer coisa que justifique uma notícia de última hora, fazendo uns empolgantes directos do local que afinal.... pasme-se... está calmo.

Que não nos restem dúvidas que existem comportamentos criminosos por parte de alguns, quer ali morem ou não, e que isso redunda no mau nome de um bairro, aliás, de uma cidade que é feita de gente trabalhadora abandonada há muito pelo Poder.

Se não queres entender isso, então sabes ainda menos da Bela-Vista do que eu. Portanto, também te agradeço que não me abras as portas da minha própria cidade, nem me estendas o poético tapete dessa revolta distante.


É que ali na Bela-Vista moram as gentes do trabalho, mas também as do desemprego. Ali na Bela-Vista faz falta a polícia como faz em qualquer outro sítio. Mas faz falta uma polícia que emane do Bairro e das pessoas, que ajude e contribua para um dia-a-dia mais saudável, que ajude diariamente o bairro e que crie pontes de confiança com os homens, mulheres e jovens, com os ciganos, timorenses e africanos que ali vivem.

A estratégia de espetar "polícias de guerra", de ostentar metrelhadoras e caçadeiras, shotguns e coletes à prova de bala é exactamente o oposto do que é preciso para criar segurança às populações da Bela-Vista.


Mas o que não podemos mesmo ignorar é que não são os polícias, com ou sem metralha, que vão resolver o problema da Bela-Vista. Porque o problema dessa cidade não é de segurança ou falta dela, não é de vigilância securitária ou falta dela.

É um problema social de profundas raizes. É um problema que resulta do acumulado processo de empobrecimento e "ghettização" das camadas empobrecidas, do desemprego e do desprezo dado às vidas de quem ali vive.


Sei que, certamente, tudo isto saberás tão bem quanto eu. Sei que também sabes (embora não te conheça) que a Presidente da Câmara de Setúbal também sabe tudo isto.


Sei que, certamente, saberás tão bem quanto eu que não é o povo da Bela-Vista que apedreja a polícia ou dispara petardos. Também sei, ou julgo saber, que saberás que esse não é o caminho para a ruptura necessária com a política que tem conduzido a Bela-Vista para o interior dos Bairros Amarelo e Azul, donde dificilmente sairá num futuro breve.


Cumprimentos

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Gratuitidade vs Acção Social Escolar

O PCP propôs a isenção de propinas para evitar o abandono escolar no Ensino Superior. Essa isenção é, segundo essa proposta do PCP, atribuída a quem esteja em situação de desemprego ou quem tenha os pais no desemprego se ainda deles depender. Também se consagra a possibilidade de que quem ganha menos mensalmente que o valor mínimo das propinas (1,3 salários mínimos nacionais) possa requerer a isenção do pagamento das propinas.

Não escrevo este "post" apenas para anunciar a medida proposta pelo PCP e rejeitada pelo PS. Embora isso bem mereça divulgação, particularmente depois de alguns canais de tv e rádio terem atribuído ao BE a paternidade de tal proposta, quando esse agrupamento político mais não fez senão copiar à cara podre a proposta dos comunistas.

Escrevo para aprofundar um pouco a discussão sobre propinas e Ensino Superior Público.

A Constituição da República Portuguesa estabelece claramente a gratuitidade progressiva de todos os graus de Ensino. Ao contrário do que o sabujo Vital Moreira tem vindo a espalhar por aí, o objectivo desse comando não é o de assegurar um sistema de acção social que permita a gratuitidade para os miseráveis. É aliás, por isso mesmo, que a Constituição da República estabelece a gratuitidade e não apenas um sistema de acção social escolar.

Na verdade, uma ponderação serena e séria, mesmo que desligado de emoções e romantismos, nos leva com relativa facilidade a deduzir que a única forma de assegurar a mínima igualdade no acesso e frequência ao Ensino Superior Público é a sua total gratuitidade. Dirão: "mas então vamos todos pagar o ensino superior dos meninos ricos?"

É a pergunta comum dos arruaceiros anti-estudantis e anti-democratas. Há várias abordagens para a resposta a essa pergunta e todas elas apontam no mesmo caminho:

a) se alguém entende que só os filhos dos ricos, só os meninos ricos, estudam no ensino superior, é caso para perguntar porque é que isso sucede. isso significa que são necessárias medidas urgentes para por fim a essa triagem social e não para a agravar.

b) se alguém acha que não devemos suportar os custos do ensino superior porque lá não tem os filhos, é caso para lhe responder que não terá então direito a usufruir dos efeitos do desenvolvimento económico e tecnológico nacional que a formação de quadros superiores traz ao país e que não terá direito a usufruir dos benefícios de protecção social criados também pelos descontos desses quadros superiores, também eles supostamente superiores aos descontos de muitos dos menos qualificados.

c) se alguém pensa que o facto de os ricos pagarem propinas os iliba de contribuirem nos impostos, então por que motivo não notámos nenhum decréscimo nos impostos desde a cobrança de propinas? basta verificar que desde então o que sucedeu não foi nem a diminuição das contribuições fiscais, nem a afectação dessas contribuições a outros serviços públicos que não o Ensino. Na verdade, os impostos permanecem no mesmo patamar ou superior, e os serviços públicos no geral sofrem degradação da qualidade, são privatizados ou encerram. Isso significa que a opção política tem sido a de limitar de tal forma o investimento público e a despesa, a bem do tal défice, que estamos rapidamente a caminhar para um Estado desfigurado ou inexistente. O Estado é cada vez mais apenas um mediador de negócios.

Então e a Acção Social Escolar não é o mecanismo de garantia da gratuitidade como diz Vital Moreira e tantos outros?

Encaminharmos a nossa análise por esta viela estreita de pensamento é fazer tábua rasa da própria Constituição da República Portuguesa e dos princípios basilares de justiça social que ela contém. Na verdade, quando a CRP obriga o Estado a assegurar a gratuitidade e simultaneamente um mecanismo de acção social, é exactamente porque uma coisa não é a mesma que a outra. A gratuitidade implica que a justiça social seja feita através de um sistema fiscal que é diferenciado em função dos rendimentos exactamente para que todos os serviços públicos possam estar igualmente ao serviço de todos. A gratuitidade implica portanto que cada um paga pelo Ensino Superior o que pode, fazendo esse pagamento através dos impostos.

No entanto, a existência de um Sistema de Acção Social Escolar não se relaciona com a gratuitidade por isso mesmo. Porque a gratuitidade é um comando democrático independente da condição social do estudante e da sua família. A acção social escolar é um elemento de homogeneização da condição de estudo e de frequência do ensino, assegurando que todos dispõem, dentro do possível, de condições semelhantes para progredirem em estudos iguais. Ou seja, a acção social é um mecanismo de equilíbrio para que os estudantes das camadas mais desfavorecidas tenham exactamente as mesmas possibilidades de sucesso escolar que os estudantes das camadas mais ricas da população. Ou pelo menos, para que essas condições se aproximem. É justo que os estudantes mais empobrecidos tenham de trabalhar, buscar sobrevivência, mendigar livros, procurar apoio de colegas e comida nos bancos alimentares, enquanto os outros dispõem de tudo, explicações, alojamento próprio, transporte próprio, etc.? Será que é assim que se promove a qualidade da formação superior e que se combate a desigualdade e galopante assimetria entre as classes?

Ao contrário do que dizem os guardiões da política neo-liberal, o Partido Socialista, o PSD e seus acólitos, a gratuitidade do Ensino Superior Público não é uma esmola que se dá aos miseráveis, é um direito de todos.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Necessidades reais e necessidades induzidas

A direita no poder, quer pela máscara de Partido Socialista ou Partido Social-Democrata, com ou sem a ajuda do CDS, tem tido uma impressionante capacidade de efectuar assinaláveis campanhas de diversão política e social. Estou certo de que essa capacidade não lhes atribui mérito exclusivo, que isto é coisa dos seus congéneres um pouco por todo o mundo. O capital, o sistema capitalista não vive de olhos fechados, bem pelo contrário, e está permanentemente atento às necessidades de se adaptar às condições em que se impõe e se sustenta.

A degradação da qualidade de vida das populações e a desenfreada exploração do trabalho conduzem a situações de permanente crise social, que só uma vez por outr se traduzem em crises económicas como a que agora atravessamos. No entanto produzem um descontentamento constante entre os trabalhadores, que urge mascarar ou iludir. Parece-me, no seguimento de algumas reflexões que tenho feito, que o sistema (PS/PSD o corporizam) português está a ficar cada vez mais hábil na manipulação das consciências, com a ajuda sempre pronta e disponível dos restantes partidos da burguesia, donde obviamente não se excluem BE e CDS.

Ora, perante uma situação de deterioração das condições de vida tão flagrante como a que vivemos, em que as lutas de protesto e de ruptura crescem diariamente na intensidade com que expressam a força popular, numa situação de instabilidade tal que os trabalhadores portugueses são confrontados com a possibilidade de a qualquer momento perderem os seus postos de trabalho, como já se passa com cerca de 500.000 portugueses, o acessório tende a substituir o essencial no mundo da política. As necessidades reais do país dão lugar às necessidades induzidas.

Há inúmeros exemplos disso e nem sequer usarei agora as necessidades induzidas de comentar à exaustão agressões inexistentes para desviar as atenções do essencial: a maior manifestação de trabalhadores no 1º de Maio dos últimos anos, muito embora vontade não me falte de aqui acusar os verdadeiros sabujos que se apressaram a agigantar tão tristes acontecimentos para silenciar a verdadeira dimensão da luta dos trabalhadores portugueses. O bom senso, porém, de que não sou particular portador, conduz-me a uma questão bem mais importante e bem mais ilustrativa:

i. O sistema capitalista, na detecção que faz diariamente dos seus próprios problemas, assume como prioridade constante a sua capacidade de regeneração e de equilíbrio. A balança treme muitas vezes, mas o sistema bem montado com a ajuda preciosa dos governos de todo o mundo lá vai aguentando o desequilíbrio.

ii. As necessidades reais da população são essencialmente materiais, pois relacionam-se directamente com a retribuição do trabalho e a distribuição da riqueza. São essas necessidades que moldam as necessidades imateriais, sendo que é óbvia a relação entre disponibilidade financeira e acesso ao lazer, à cultura, à arte, ao tempo livre, e a tantos outros elementos imateriais do bem-estar.

iii. As necessidades reais do país estão, portanto, encaixadas na esfera política, principalmente económica, que determina o modelo de produção e distribuição da produção e da riqueza. A política de concentração da riqueza e de extorsão e exploração do trabalho conduz inexoravelmente ao empobrecimento dos trabalhadores. E essa política determina em grande parte a dinamização do aparelho produtivo nacional (agrícola, industrial, imaterial) e do consumo interno ou ausência dela. As necessidades obectivas, reais, do país prendem-se pois, essencialmente com o cariz político e o rumo que tem orientado os sucessivos governos na sua senda de desmantelamento do Estado e de submissão aos grandes interesses económicos.

iv. As necessidades reais do país são aquelas cuja resolução reside então na melhoria das condições de vida dos portugueses, no aumento dos salários e das pensões e na garantia dos direitos e liberdades fundamentais contidos na Constituição da República Portuguesa. As necessidades reais dos jovens são a habitação, a educação, o emprego com direitos, os salários, as bolsas de estudo, a mobilidade, o direito ao desporto e à cultura.

v. Como forma de induzir necessidades, o capitalismo criou o consumismo supérfluo e é perito nas criações do género. As necessidades induzidas, porém, não param de ser inventadas. Ora é o PS, ora PSD, constantemente, com a ajuda da comunicação social, trazem de forma planificada para a atenção pública as mais estapafúrdias das ilusões. ---- Ele vai de introduzir quotas para mulheres na política, de limitar mandatos, de acusar os partidos de tudo e mais alguma coisa assim metendo todos no mesmo saco, de apelar a alterações ao regime democrático e representativo. Nesta última me centrarei.

v. a) ora perante tal descrédito e desconfiança perante o sistema político, importa cada vez com mais intensidade iludir as verdadeiras causas desse comportamento popular. Acima de tudo importa assegurar a imutabilidade da natureza exploradora do sistema capitalista que domina o país e determina o seu rumo, de forma super-estrutural. Assim, perante a possibilidade de descontentamento político, o capital apressa-se e antecipa-se apontando a necessidade de revisão do modelo de representatividade parlamentar do país. Assim se ilude uma necessidade concreta.

v. b) ao invés de permitir que a população se aperceba que a questão central está na política levada a cabo pelos diferentes partidos e seus eleitos, ilude o país com a ideia abstracta de remodelação do modelo parlamentar para um que assente em eleições por círculos uninominais, prometendo uma maior aproximação entre os eleitos e os eleitores. Ora é caso para perguntar, o que impede os 230 deputados eleitos actualmente de se ligarem aos eleitores. Na verdade, todas as semanas, se vêem os deputados do PCP e do PEV nos mais variados locais em contacto com as populações e com os trabalhadores, mas são só 13. Onde estão os 121 do PS e os 70 e tal do PSD? Que os impede de irem ao contacto com as populações já que estão tão empenhados nisso?

v. c) Assim, se criou uma necessidade induzida. Por todo o lado se comenta que o que está mal é a forma de eleger os deputados e que é preciso alterar a forma de eleição. Por todo o lado se questiona a própria forma da Assembleia da República (e eu faço-o ainda mais numa perspectiva diferente - como bem se pode ler nos posts sobre parlamentarismo neste blog) sem que nunca se permita que se questione a sua composição. Esta necessidade de alteração do regime democrático é uma necessidade induzida - a hegemonia cultural e a comunicação social dominante assim vão disseminando pela voz dos funcionários do regime e oradores da opinião-feita.

v. d) Perante a necessidade real e objectiva de alterar a composição da Assembleia, condicionando o poder e alterando o rumo político do país, induz-se para diversão colectiva de que é preciso é mudar a forma como se elegem os deputados, mesmo que para lá vão exactamente os mesmo fazer precisamente os mesmos. Como já dizia o outro: "é preciso que alguma coisa mude, para que tudo fique na mesma".

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Dizem estes autênticos sabujos, perdoem-me a expressão, que falam a esta hora na Sic notícias (um tal de José Manuel Fernandes e um Gomes Ferreira) que a crise é culpa do povo que tem vivido acima das suas possibilidades e que o sindicalismo está obsoleto porque só pede mais dinheiro e não apresenta soluções.

Estes encartados democratas, comentadores de excelência, devem ganhar bem acima do que a média dos trabalhadores portugueses e vem para aqui dizer que o povo gasta acima das suas possibilidades? Vocês é que gastam acima das reais possibilidades, que nunca devem ter produzido porra nenhuma na vida e andam para aí com salários de luxo, dos quais certamente passa ao lado a crise. Ora, então aqueles que trabalham horas a fio, sem quaisquer direitos e com salários de miséria é que vivem acima das suas possibilidades ou as suas possibilidades estão abaixo do esforço que fazem, senhores? Vós que daí falais do cimo da distância, ide trabalhar!

Os sindicatos, dizem eles, são antiquados e estão obsoletos. Dizem que só querem mais poder de compra e que querem que os patrões paguem a crise. É preciso descaramento! Até hoje sempre os trabalhadores pagaram a crise. Caso vocês não se tenham apercebido, os trabalhadores estão em crise há muito tempo, pois trabalham apenas para concentrar cada vez mais lucro nas mãos dos patrões. Mostrem-me o Belmiro ou o Amorim a passar fome, ou a ter de tirar os filhos da escola, mostrem os ex-ministros e os parasitas do PS e do PSD e os aparelhistas a serem obrigados a ir para as filas do banco alimentar e das associações de socorros mútuos. Mostrem-me esses seres rastejantes a abdicarem dos seus jactos, dos seus carros de luxo, dos seus anéis de diamantes. E depois venham dizer-me quem vive acima das NOSSAS possibilidades!

Para quem não saiba, e os senhores que falam agora na SIC sabem-no bem - apenas o escondem - a CGTP tem apresentado centenas de propostas para combater o desemprego, muitas propostas para viabilizar empresas, muitas propostas para dignificar o trabalho. Na verdade, os sindicatos estão na linha da frente da discussão e proposta nas mais variadas áreas políticas. Desacreditar os sindicatos é apenas o caminho mais fácil para defender o Governo e a política de direita. É altura de dar voz a quem está do outro lado!

agressões?

1. Eu estava presente e mesmo ao lado dos episódios a que têm chamado "violência" e "agressões" a Vital Moreira. Na verdade, e testemunho porque vi, a passagem desse homem pela manifestação da CGTP gerou grande ira entre os manifestantes mas não deu lugar a agressões físicas.

2. As delegações dos Partidos que cumprimentam a Executiva da CGTP nestes momentos são constituídas pelas direcções dos partidos. Vital Moreira, segundo diz, é um independente. Ou seja, não é certamente um dirigente institucional do PS. É apenas um candidato a eleições. Ou seja, o que o levou ali foi um acto de campanha eleitoral e provocação e não um cumprimento institucional.

3. O PS quer assim apenas iludir a dimensão da luta dos trabalhadores portugueses na manifestação do 1º de Maio convocada pela intersindical.

4. Vital Moreira não foi exluído das manifestações de trabalhadores, nem foi expulso, nem foi agredido nem injuriado. Vital Moreira auto-excluiu-se há muito quando tomou o lado dos inimigos dos trabalhadores, assim agredindo e injuriando ao longo dos anos a população trabalhadora de Portugal.

5. O PCP e a CGTP, como julgo que é absolutamente óbvio e que só não vê quem não quer, não podem pedir desculpa por um episódio que não sucedeu, tal como ao fazê-lo assumiriam responsabilidades que não lhes cabem.

6. Chega de manipulação. Está à vista de todos que o homem não foi agredido e eu próprio apupei a delegação do PS. A vitimização que está a fazer de si próprio com a ajudinha de todos os restantes partidos, com excepção do PCP, é não mais que lamentável.

7. A luta dos trabalhadores portugueses assumiu hoje um momento alto de reivindicação e de mobilização. Eram milhares e milhares de jovens, homens e mulheres, que erguiam palavras de esperança e de combatividade. A labuta diária deste povo é hoje espezinhada pelos governantes que não respeitam os mais elementares direitos de quem trabalha e este 1º de Maio foi uma expressão máxima da dignidade e da força da luta. No final do dia, é isso que conta!

8. em jeito de desabafo: escrevo enquanto vejo a sic notícias que chama para comentar o 1º de Maio dois comentadores declarada e assumidamente anti-sindicalistas, anti-comunistas, tecnocratas e apoiantes dos partidos de direita. Será de estranhar que até agora mais não tenham feito que dizer mal do PCP e da Inter?