Lembro-me bem de quando surgiram os primeiros anúncios da adesão de Portugal ao Processo de Bolonha, das maravilhas anunciadas, do paraíso do Espaço Europeu de Ensino Superior. Com Bolonha, tal como já sucedera com outras adesões, foram prometidas as melhores evoluções. Foi vendida a ideia de que todos estudaríamos fora do país, que em Portugal, as universidades se tornariam oxfords; que os estudantes portugueses iriam estar na crista da onda da modernidade.
Que o paradigma deixaria de estar assente na transmissão do conhecimento e passaria a ser baseado na aquisição de competências, que o processo de ensino passaria a estar centrado sobre o aluno, que as escolas se modernizariam ao cúmulo do desenvolvimento.
Que os estudantes deixariam de passar tantos anos a absorver conhecimento académico e que em três, em vez de cinco, aprenderiam tudo o necessário para uma vida plena de empregabilidade.
6 anos depois da adesão concreta a Bolonha, as ilusões desfazem-se, os seus defensores - do BE, ao CDS com a excepção única do PCP-, vão esmorecendo o entusiasmo que antes os fazia inflamar discursos sobre o internacionalismo (a internacionalização), sobre o emprego e sobre as competências, enfim, o habitual chorrilho de clichés que povoa o imaginário da burguesia e infelizmente vai colonizando a realidade dos trabalhadores.
6 anos depois da adesão de Bolonha, resultados concretos?
1. Os estudantes não estudam 3 anos, estudam 4 ou 5 - para obter um grau que mudou de nome mas que continua a ser a "licenciatura". Porém, pagam os últimos anos do curso a peso de ouro, quando antes todos os anos eram financiados igualmente pelo estado. Na prática, um estudante antes pagaria 5 mil euros por uma licenciatura e agora paga 3 mil pelos primeiros três anos e 2, 4, 5 ou 10 mil por cada um dos seguintes anos.
2. Os estudantes não frequentam hoje cursos mais qualificados, bem pelo contrário. O sub-financiamento das instituições degrada paulatinamente a qualidade do ensino. O tal "ensino centrado no estudante" traduziu-se afinal na sobrecarga extra-lectiva do estudante e a libertação de horas de aulas - com peso no emprego docente e com efeitos e impactos na igualdade entre estudantes. Os que tenham meios e apoios para a realização de grandes trabalhos escolares poderão suprir de forma bastante mais eficaz a falta de aulas teóricas do que os que não tenham esses meios e que muitas vezes serão até obrigados a trabalhar para pagar os estudos.
3. O emprego jovem decai ano após ano. O desemprego alastra, apesar de Bolonha e a licenciatura de Bolonha vale, objectivamente, menos no chamada "mercado de trabalho" do que a Licenciatura pré-Bolonha.
4. O aparelho produtivo continua a definhar, a intensidade em I&D na economia e a incorporação de mais-valias geradas por I&D na economia decaem ou estagnam, o que significa que não existe qualquer transferência da qualificação científica da Academia para a indústria, ou que a que existe é irrelevante. Os spin-offs tornaram-se em nichos de exemplo, mas representam pequeníssima fatia da produção nacional e de outra forma não podia ser.
5. O número de estudantes portugueses a fazer intercâmbios não aumentou significativamente, nem tem qualquer relação com a aplicação de Bolonha. Continua a estudar no estrangeiro, em estágios ou intercâmbios, Erasmus e outros programas, apenas quem dispõe dos meios para poder fazê-lo. E nessa matéria, Bolonha nada mudou.
6. A produtividade do trabalho não conheceu nenhum extraordinário crescimento, ao contrário do anunciado e prometido. O regime de baixos salários e cada vez mais pesados horários agrava-se e Bolonha representa um contributo para o aumento da exploração do trabalho, na medida em que desvaloriza a formação pessoal do trabalhador e, portanto, a sua retribuição salarial.
7. Evidentemente, e escusadas serão outras considerações, a Universidade Portuguesa não ficou de repente igual às melhores universidades europeias, ao contrário do que diziam.
8. Um dos efeitos, ainda por sentir, mas que desde já adivinho é o da concentração de elites em focos universitários. As potências económicas captam os estudantes com mais aptidão, captam a elite e os países frágeis deixam de formar os seus próprios recursos humanos de I&D. A investigação tenderá a concentrar-se no eixo tecnológico da Europa - nomeadamente Holanda, França, Grã-Bretanha e Alemanha.
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